«Mas um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele e, ao vê-lo, encheu-se de compaixão» (Lc 10,33)
Martine ia numa carruagem do metro de uma grande cidade europeia. Todos os passageiros estavam concentrados nos seus telemóveis. Virtualmente estavam ligados, mas, de facto, estavam aprisionados no isolamento. Questionou-se: «Será que perdemos a capacidade de nos olharmos nos olhos?».
É uma experiência comum, sobretudo nas sociedades ricas de bens materiais, mas cada vez mais pobres em relacionamentos humanos. O Evangelho, no entanto, apresenta-nos sempre a sua proposta original, criativa, capaz de “fazer novas todas as coisas”[1].
No longo diálogo com o doutor da Lei que o questiona sobre o que é preciso fazer para ter como herança a vida eterna[2], Jesus responde com a famosa parábola do Bom Samaritano: um sacerdote e um levita – figuras de relevo na sociedade daquele tempo – veem um homem agredido por salteadores, caído na berma da estrada, mas passam adiante.
«Mas um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele e, ao vê-lo, encheu-se de compaixão»
É preciso ser capaz de não olhar apenas para os dons pessoais, mas também para as muitas potencialidades e a multiplicidade de visões e de opiniões que se apresentam diante de nós, naqueles que vivem ao nosso lado e com quem nos relacionamos, e até nas pessoas que encontramos por acaso. É importante, com todos, manter a autenticidade no coração e também ter a consciência dos limites do nosso ponto de vista.
Esta palavra de vida poderia ser um lema a adotar em todas as situações de diálogo e de confronto. Escutar o outro – não necessariamente para aceitar tudo, mas sabendo que é possível encontrar algo de bom naquilo que ele diz – favorece uma abertura do coração e do pensamento. É fazer o vazio dentro de nós, por amor, e ter assim a possibilidade de construir algo juntos.
«Mas um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele e, ao vê-lo, encheu-se de compaixão»
Ao doutor da Lei, que conhece bem o mandamento divino do amor ao próximo[3], Jesus propõe como modelo um estrangeiro, considerado cismático e inimigo. Ele viu o viajante ferido e encheu-se de compaixão, um sentimento que nasce de dentro, da profundidade do coração humano. Por isso, interrompe a sua viagem, aproxima-se e cuida dele.
Jesus sabe que cada pessoa humana está ferida pelo pecado e esta é precisamente a Sua missão: curar os corações com a misericórdia e o perdão gratuito de Deus, para que sejam capazes, por sua vez, de proximidade e partilha.
«[…] Para aprender a ser misericordiosos como o Pai, perfeitos como Ele, é preciso olhar para Jesus, revelação total do amor do Pai. […] O amor é o valor absoluto que dá sentido a tudo o resto […] que encontra a sua expressão mais elevada na misericórdia. É a Misericórdia que ajuda a ver sempre novas as pessoas com quem vivemos no dia a dia, na família, na escola, no trabalho, sem recordar os seus defeitos, os seus erros. Leva-nos a não julgar, mas a perdoar as ofensas que sofremos. E até a esquecê-las»[4].
«Mas um samaritano, que ia de viagem, passou junto dele e, ao vê-lo, encheu-se de compaixão»
A resposta final e decisiva expressa-se com um convite claro: «Vai e faz tu também o mesmo»[5]. É isso que Jesus repete a quem aceita a sua Palavra: tornar-se próximos, tomando a iniciativa de “tocar” as feridas das pessoas que encontramos, no dia a dia, pelas estradas da vida.
Para viver a proximidade evangélica, antes de tudo, peçamos a Jesus que nos cure da cegueira dos preconceitos e da indiferença, que nos impede de ver para além de nós mesmos.
Depois, aprendamos com o Samaritano a capacidade da compaixão, que o levou a colocar em jogo a sua própria vida. Imitemos a sua prontidão para dar o primeiro passo em direção ao outro com a disponibilidade para o escutar, para fazer nossa a sua dor, livres dos juízos e do medo de “perder tempo”.
Foi a experiência de uma jovem coreana: «Procurei ajudar um adolescente que não era da minha cultura e que eu não conhecia bem. No entanto, apesar de não saber o que fazer nem como fazer, enchi-me de coragem e tentei ajudá-lo. Para minha surpresa, ao oferecer aquela ajuda, notei que me senti “curada” das minhas feridas interiores».
Esta Palavra oferece-nos a chave de ouro para atuar o humanismo cristão: torna-nos conscientes da nossa humanidade comum, em que se reflete a imagem de Deus, e ensina-nos a ir com coragem para além da mera “proximidade” física e cultural. Nesta perspetiva, é possível alargar as fronteiras do “nós” até ao horizonte do “todos” e redescobrir a base fundamental da vida social.
Texto preparado por Letizia Magri
[1] Cf. Ap 21,5. [2] Cf. Lc 10,25-37. [3] Dt 6,5; Lv 19,18. [4] C. Lubich, Palavra de Vida de junho de 2002, in Parole di Vita, a/c Fabio Ciardi, (Opere di Chiara Lubich 5), Città Nuova, Roma, 2017, p.659. [5] Lc 10,37.